Eles Foram a História




Houve uma ^D1181986F520E502B402010FE048D1DB00A947F6B741BC02C7^pimgpsh_fullsize_distrépoca em que jogadores não calçavam chuteiras coloridas, não comemoravam gols com dancinhas ridículas, não exibiam cortes de cabelo exóticos, nem eram teleguiados por agências de publicidade ou agentes. Houve uma época em que os jogadores de futebol eram homens, na acepção moral da palavra, e os mais nobres entre eles jogavam no Fluminense. E dentre esses nobres de alma que defenderam as 3 cores que traduzem tradição, nenhuma dupla exerce um papel de destaque tão grande na mitologia tricolor quanto Assis e Washington.

Ciganos do futebol, tendo defendido outras cores antes de aportarem no Fluminense, Assis e Washington foram moldados na forja da dificuldade. O Carrasco Tricolor, nascido na capital paulista, iniciou a carreira atuando pela Juventus e em seguida pela Portuguesa. Ainda sem saborear o sucesso, Assis complementava sua renda nos fins de semana jogando na várzea em troca de cachê (ou de pão, se o leitor assim preferir), ao mesmo tempo que se dedicava aos estudos. Passou ainda pelo São José e pela Inter de Limeira, mas foi na Francana que a sorte começou a mudar: pelo clube do interior paulista fez 17 gols e chamou a atenção do São Paulo, para onde foi negociado. Pelo tricolor do Morumbi Assis conquistou o bicampeonato estadual (1980-81), mas acabou não se firmando na equipe e se transferiu para o Internacional. Nascia ali um encontro que mudaria de vez sua trajetória.

Washington teve um início de carreira atípico. Sem ter vingado nas divisões de base, deixou sua terra natal, Valença (sul da Bahia), aos 20 anos para jogar no Galícia. Ali os gols começaram a surgir em profusão e chamaram a atenção de Aymoré Moreira, técnico da seleção brasileira bi mundial em 62, que decretou que o jogador estava predestinado a brilhar nos gramados. O Corinthians, atraído pelas notícias de que surgia na Bahia um grande goleador, foi buscá-lo, mas o casamento não foi dos mais bem-sucedidos. Vendido ao Internacional em 1981, Washington encontraria no clube porto-alegrense o também recém-adquirido Assis e os dois formariam a partir dali uma parceria indissociável. A passagem dos dois pelo Colorado não foi porém, das mais marcantes, e acabaram ambos negociados junto ao Atlético-PR em troca do lateral Augusto. Não é preciso dizer quem saiu ganhando nessa troca. Pelo Atlético-PR, Assis e Washington tiraram o clube curitibano de um jejum de 12 anos sem título estadual e o centroavante baiano terminou a competição como artilheiro, com 23 gols. Surgia ali o apelido “Casal 20”, que viria a marcá-los pelo resto da carreira.

Os gols de Washington despertaram o interesse do Fluminense. O Atlético, no entanto, só aceitava negociar a dupla. O Fluminense fechou o pacote e levou os dois. O resto é pura história. Juntos conquistaram o brasileiro de 1984 e o tricampeonato carioca de 83-84-85. Se Assis era o cérebro, Washington era a alma. Se Assis era a cadência e a clarividência, Washington era explosão. Assis levou o Evangelho do bom futebol aos gentios rubro-negros, catequizando-os duas vezes no templo sagrado do Maracanã, sagrando-se Carrasco, mas um Carrasco da Paz. Washington nos presenteou com fartura de gols, tendo certa vez, causado escoliose no goleiro vascaíno Acácio, ao entortá-lo duas vezes antes de empurrar a bola para o fundo das redes. Nos lances de bola parada, a torcida tricolor vaticinava: “ão ão ão , na cabeça do negão”, tamanha a expectativa de mais um gol de cabeça do centroavante de 1,88m. A dupla também protagonizou aquela que é considerada a maior aula de aplicação tática jamais vista no futebol, eliminando o Corinthians num Morumbi lotado, na semifinal do brasileiro de 1984.

Quis o destino que esses duas divindades do futebol fossem colhidas da vida terrena em um espaço de tempo muito curto. Entre o passamento de Washington César dos Santos e o de Benedito Assis da Silva não se deu mais do que 42 dias. Estocada dupla no coração da torcida tricolor. Lá em cima, em algum lugar do céu onde o amor marca encontro com a saudade, o Casal 20 dos gols e títulos inesquecíveis projeta luz sobre a sede das Laranjeiras, ajudando a lembrar os que hoje lá trabalham do que o Fluminense é feito.

#BrunoLeonardo