
Movimentação, toque de bola, infiltração, improvisação, drible, tabela e triangulação são expressões que foram banidas do nosso futebol. Banidas? Sim, amigo leitor. Basta ligar a TV e, de repente, como num decreto do Marquês de Pombal, nossa língua geral do futebol, o dialeto dos boleiros, soa como um idioma proibido. Nossos jornalistas falam de compactação das linhas, último terço do campo, intensidade, falso nove e blá-blá-blá. Trocamos a língua dos boleiros, o nosso Nheengatu da bola, pelo português de Portugal. Pura infelicidade dos fatos e da língua.
O complexo de vira-latas, nosso sentimento voluntário de inferioridade, não se deu apenas na linguagem. Não, amigo leitor. Basta observar o futebol praticado no Brasil dos últimos 10, 15 ou 20 anos: o brasileiro abandonou sua forma de jogar. No lugar do talento, da improvisação, do jogo inspirado e vistoso, o futebol pentacampeão assumiu o xadrez tático, a falta de imaginação e acuidade estética. Aqui, no Brasil, a retranca pela retranca soa como medo, como anemia da coragem. No país do futebol até o jogo defensivo precisa ser bem praticado.
O jogo entre Fluminense e Athletico me trouxe um fio de esperança. É preciso, contudo, manter os pés no chão. Nosso time é irregular e, portanto, é difícil fazer qualquer projeção na atual temporada. Por outro lado, eu quero exaltar a exibição do nosso Tricolor. Não fizemos um jogo apoteótico, um carnaval de Joãozinho Trinta, uma partida exuberante de beleza e imaginação. Não, leitor. Muito menos jogamos como uma Máquina, como o lendário escrete dos anos 70, a realização do mais puro e sublime futebol. A equipe comandada por Odair Hellmann, por outro lado, teve lampejos de brasilidade, de um jogo baseado na movimentação, na velocidade e na improvisação.
Sem abandonar a disciplina tática, o nosso Fluzão foi boleiro e, em diversos momentos, fizemos o jogo fluir. Com uma boa movimentação do jovem Marcos Paulo, os jogadores de frente do Fluminense se procuravam, se descolavam e confundiam a marcação adversária. Em diversos momentos, o Tricolor das Laranjeiras foi brasileiro, foi um time que buscou o jogo e, com toque rápidos, aproximações e tabelas confundiu o adversário. Criamos boas chances, buscamos o resultado e praticamos um futebol (até certo ponto) vistoso. O Tricolor realizou boas tabelas, passes ousados e dribles. No último gol, Marcos Paulo fez uma bela jogada: driblou e finalizou com classe. Sim, amigo Tricolor! Ele driblou e finalizou com classe. Alguém lembra do tempo em que a beleza e a classe eram regras no nosso futebol?
É preciso lutar contra o eclipse da tabela, da troca de passes em velocidade, contra a proibição do improviso, do drible e do jogo estético. É preciso protestar contra os que tentam nos privar da nossa identidade futebolística, do patrimônio artístico e portentoso do nosso jogo. O talento ainda é capaz de decidir uma partida de futebol! Repito: o talento ainda é capaz de decidir uma partida de futebol! Um drible tem o poder de desmontar qualquer defesa, possui a força e a vocação para desarticular a marcação adversária. O drible é a alma criadora do futebol brasileiro. É preciso revogar o decreto que proibiu a finta.
Que venha o Vasco…
Teixeira Mendes
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