 
Começo com uma citação de um grande poeta:
‘’Bem-aventurados os que não entendem nem aspiram a entender de futebol, pois deles é o reino da tranquilidade.
Bem-aventurados os que, por entenderem de futebol, não se expõem ao risco de assistir às partidas, pois não voltam com decepção ou enfarte.’’
(Sermão da Planície – Crônica de Carlos Drummond de Andrade no Jornal do Brasil em 18/6/1974)
Drummond conhecia a alma humana e, sobretudo, compreendia a verdade do futebol: o esporte bretão é o palco que explicita a condição humana, as contradições e os dilemas da paixão de ser e existir.
Bem-aventurados os entendem a diferença entre a ‘’posse de bola’’ e o ‘’toque de bola’’. Os que compreendem a necessidade de definir o placar quando é possível, de vencer o clássico, de decidir o jogo.
Bem-aventurados os que se desesperam com o recuo tolo, os que vaiam a falta de coragem para a vencer. O futebol se parece com a vida, pune aquele que se acovarda na hora da decisão.
Bem-aventurada é a intuição passional do torcedor fanático. Ele vaia a jogada bisonha e, no instante seguinte, aplaude a boa jogada. O futebol é feito de sentimentos contraditórios.
Bem-aventurados os que criticam, os que apoiam, os que são pessimistas, os que são otimistas, os que torcem e apenas torcem. Bem-aventurado é aquele que entende o fatalismo do jogo: na cardiologia da bola, o coração não bate … apanha!
Bem-aventurada é a decepção, a tristeza diante do empate, a queda na tabela. Bem-aventurado é o sentimento unânime dos Tricolores, a amargura que faz declinar a esperança.
Bem-aventurada é contradição de torcer, de sentir, de viver a gratuidade da paixão futebolística. Há uma irmandade, um parentesco profundo entre a taquicardia e o gol sofrido no final do jogo.
Bem-aventurado é o colunista irritado, cheio de raiva e ironia. Ou também o leitor, aquele que interpreta a raiva e a ironia. Bem-aventurado é o futebol, o imprevisível, a caixinha de surpresas, o clichê.
Que uma vitória no meio de semana renove os ânimos. Apenas o triunfo pode redimir a amargura e o sentimento de tristeza e decepção. Por enquanto, amigo leitor, nos resta a irritação, a vaia e a amargura!
Teixeira Mendes
