Aílton conta tudo sobre os bastidores do Flu no título de 1995




Ailton é o primeiro jogador agachado da esquerda para a direita do histórico Fluminense de 1995! (Foto: Divulgação)
Ailton é o primeiro jogador agachado da esquerda para a direita do histórico Flu 1995! (Foto: Divulgação)

O site oficial do Fluminense, representado pelo assessor de imprensa do clube, Marcello Vieira, realizou uma histórica entrevista com o Aílton, um dos heróis da conquista do título estadual de 1995. Na entrevista, Aílton detalhou os bastidores do time e do clube, como por exemplo, a emoção do Renato Gaúcho no último treino antes do maior Fla-Flu de todos os tempos. Confira abaixo!

Como foi sua chegada ao Fluminense após tanto tempo atuando no futebol japonês? Alguma lembrança especial?

Estava voltando do Japão para o Brasil após cinco anos. Ia acertar até com outro clube, mas não deu certo. Nisso, o Lira me convidou. Jogávamos futevôlei juntos e acabei indo para o Flu. Na estreia, perdemos por 1 a 0 para o Madureira e o Joel Santana reuniu o grupo na apresentação e fez a seguinte pergunta: quem acredita aqui que não dá para ser campeão? Muita gente ficou na dúvida. E ele disse. Eu acredito. Seremos campeões. Cheguei em casa empolgado, dizendo que ia ser campeão e minha mulher duvidou. Não era para menos. Tínhamos perdido para o Madureira. Mas disse que tinha gostado do que o treinador tinha falado. Aquilo mexeu comigo desde o início.

Aquele grupo passou por muitas dificuldades, como atrasos de salários, mas nem por isso esmoreceu. Qual foi o segredo para a sinergia do elenco?

Esquecemos a parte financeira e focamos no objetivo. Fizemos um planejamento de ajuda entre nós. Renato pagava boletos bancários. Eu e Djair ajudávamos com gasolina e outras questões como passagens de ônibus. Tínhamos uma condição financeira um pouco melhor. Esquecemos os problemas, salários e focamos na luta pelo título. Isso fortaleceu o grupo e até protegeu a própria diretoria. Sabemos que todo trabalhador é digno do próprio salário, mas quisemos focar no objetivo de ser campeão. Isso, inclusive, ajudaria o clube a ter mais receitas e pagar as dívidas.

Foi longe de ser uma campanha fácil, né? Em certo momento, o Flu chegou a depender de resultados.

Sim. Teve um momento em que quase ficamos fora. Tivemos um 0 a 0 com o Vasco em que tínhamos que ganhar, mas a combinação de resultados ajudou. Chegamos na fase final bem atrás em termos de pontuação dos demais, mas foi um grupo de muita luta. Quando fala apenas do gol do título apaga muita coisa que aconteceu. Além da parte financeira, tivemos tropeços e seguimos de pé. Tinha uma liderança no grupo que não deixava o espírito cair. Essa troca de ideias fez o Fluminense acreditar mais ainda. Foi isso. A união, a parte tática muito bem cumprida. Tudo isso ajudou bastante.

Agora falando especificamente sobre aquele jogo histórico do gol de barriga. Como foram os bastidores daquela decisão?

O que pouca gente sabe daquele jogo é que estávamos no hotel em Ipanema e um rapaz chegou para o Joel e disse: Se fosse vocês sairia do hotel. Está vindo uma galera soltar fogos por volta das duas da manhã. O Joel resolveu acreditar. Disse que o grupo ia para o cinema e voltava mais tarde. Fomos para outro hotel. Dormimos no outro hotel e voltamos no dia seguinte para almoçar. E de fato a queima de fogos ocorreu. Duas da manhã disseram que parecia que ia cair o prédio. Pessoas de idade passando mal. Felizmente não estávamos no hotel. Esse informante nos poupou de um grande transtorno. Se o grupo tivesse enfrentado uma noite sem dormir, ia ser muito ruim. Ficou marcante pra gente. Saímos na frente mais uma vez.

E a confiança do time antes de enfrentar aquele Flamengo, recheado de grandes jogadores como Romário, Sávio, Branco. Era o ano do centenário deles. Um grande desafio…

Eles tinham o ataque dos sonhos. Para nosso grupo foi tipo David e Golias. Flamengo com jogadores de nome e a gente com um time modesto, porém bem treinado. Era um jogo que a força tinha que vir de dentro, com superação, sabíamos da importância de vencer o Flamengo no centenário. Não podíamos dar brecha, eles conseguiram o empate, mas nosso terceiro gol foi um prêmio para toda a luta, batalha que tivemos. Nosso time taticamente era perfeito e esse time forte deles premiou isso tudo. Eram nove anos sem títulos no Flu. Saiu matéria dizendo que não valíamos 10% da canela do Romário e isso nos deu força. Pensamos: Será que somos tão ruins assim? E hoje, 20 anos depois estamos falando do título do gol de barriga. Não tem coisa melhor. Vou dar a brecha pro Renato de dividir com ele o mérito do gol, mas na súmula foi meu. Mas quem não conhece o Renato Gaúcho acha que ele é metido. É totalmente o contrário. O que ele fez no grupo foi 80% do título. Ele chorou no último treino antes do jogo. Começou a falar e chorar. Todos se abraçaram, choraram. E fomos premiados. Era um grupo de vencedores. Gente acostumada a ser campeã, mas sem muito nome. E nós conseguimos.

Vocês vinham de vitórias antes da final. Confiança em alta…

Foi muito boa a atmosfera porque tínhamos vencido dois jogos antes da final. Isso nos deu confiança porque tínhamos aprendido a jogar contra o Flamengo. O Joel Santana chegou pra gente e disse que o Flamengo não gostava de contato. Tínhamos que ir para o choque. Quando vimos, não estávamos mais indo para o choque contra o Flamengo porque estávamos jogando bem, rodando a bola, posse de bola boa, criando situações. Aquilo nos motivou para a final. Lima sabia muito bem como marcar o Romário, estava dando certo e ele era um dos melhores do mundo na área. É difícil saber marcar o Romário, mas estava funcionando. Fizemos dois a zero, com chance de fazer mais. Mas sabíamos da qualidade do adversário. Nosso time estava focado, levamos dois duros golpes e fomos abençoado com um gol estranho que está marcado até hoje na história.

E aquele gol? Time com menos jogadores em campo. Torcida do Flamengo já festejando o título. Como foi estar dentro do campo naquele momento e fazer história com a camisa tricolor?

Antes de acontecer a situação do gol, cheguei para o Djair e disse que só tinha um jeito de fazer o gol. Disse para ele tocar em mim que ficaria aberto pela ponta e sairia driblando. Quando ele tocou no Ronald, que o Ronald passou a bola para mim eu simplesmente não entendi. Estava já dentro da área. Preparei para chutar, o Charles veio, cortei para um lado. Ele fechou. Cortei de novo. Ele fechou. Aí não tinha mais como. Dei outro corte e chutei. Chutei para o gol para fazer o gol direto, mas a bola resvala no Renato e entra… (risos) Na súmula o gol é meu. O Léo Feldman, árbitro daquela final diz que o gol é meu. Renato fica até irado com isso. Mas estou brincando. Vou dar um desconto para o Renato e dizer que o gol é nosso.

Nesta quinta-feira, dia 25, você estará presente no evento em comemoração aos 20 anos do gol de barriga. Como é para você reviver isso?

É fantástico valorizar a história. Não só para o engrandecimento do clube, mas para o ex-atleta também. É importante ser lembrado e relembrar situações. O Flu está focado em reconhecer quem fez história por ele. Acho que a pessoa que não liga para reconhecimento é frustrada. Quem não quer ser reconhecido? Se você faz algo com excelência, quer reconhecimento.

O que significou o Fluminense Football Club na vida do Ailton?

O Fluminense foi uma abertura de retorno. Abriu as portas para mim quando achava que não ia ter mais oportunidade. Estava no Japão. É um clube que está no coração. Meu filho é Flu doente. É um clube que respeito bastante, me valorizou no momento mais difícil e felizmente consegui dar um retorno. Acreditou num atleta que estava há cinco anos fora do futebol brasileiro. É um lugar que aprendi a gostar.

Fonte: Fluminense Football Club / Foto: Divulgação

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