Saiba quem é Jamie Hamilton, técnico escocês e fã de Fernando Diniz, do Fluminense




AS, da Espanha, exaltou Fernando Diniz (Foto: Marcelo Gonçalves / Fluminense FC)



Imagina que um dia você, brasileiro e fã de futebol, vai a um pub em Glasgow, maior cidade da Escócia, com a camisa do seu time. Chegando lá, faz amizade com um dos funcionários do bar, fala com ele sobre o esporte e até descobre que ele é técnico de um time sub-16 da segunda divisão escocesa quando não está no bar. Legal, né? Ele então pergunta qual o seu treinador favorito. Você responde e escuta o técnico preferido do novo amigo, que fala num tom de alívio de quem finalmente será entendido: Fernando Diniz.

Esse é Jamie Hamilton. A cena aconteceu de verdade com Thiago Rocha, botafoguense que trabalha no Redmonds, o pub escocês, e quase caiu para trás ao ouvir o nome do técnico do Fluminense certo de que escutaria o amigo falar em Klopp ou Guardiola. Jamie concilia o trabalho de bartender com o de técnico do time Sub-16 do Ayr United, uma equipe modesta da segunda divisão escocesa. Por mais que tenha que seguir o modelo predeterminado pelo clube, também dá um jeito de colocar as ideias do jogo funcional – ou “relacionismo” como prefere falar – de Fernando Diniz em prática.

Mas por que Diniz? A resposta de Jamie é simples: “É divertido, imprevisível e quase espontâneo”.

O portal ge conversou com o escocês no dia anterior à publicação do “The New York Times” que diz que o futebol parece caminhar para o estilo “aposicional” utilizado pelo treinador tricolor. A imprevisibilidade foi justamente o que cativou Jamie quando viu os primeiros trechos de jogos de Fernando Diniz.

Jamie Hamilton, técnico escocês e fã de Fernando Diniz, do Fluminense — Foto: Arquivo Pessoal

Jamie Hamilton, técnico escocês e fã de Fernando Diniz, do Fluminense — Foto: Arquivo Pessoal

– Quando nós treinamos às vezes ficamos um pouco arrogantes. Gostamos de planejar os jogos e tudo mais na nossa cabeça, falamos para os jogadores fazerem determinado movimento e pedimos a eles para repetirem os movimentos nos treinos. E nos jogos queremos que eles façam esses movimentos repetidos. Isso é normal. É legal ver uma forma diferente que está mais ligada à criatividade dos jogadores, em vez da criatividade do técnico. Então, essas foram as coisas que eu percebi quando vi os vídeos. Depois, comecei a ver os jogos completos e comecei a virar um fã.

Ativo no Twitter, onde normalmente expõe análises de lances do Fluminense e debate sobre as diferentes correntes no futebol, Jamie Hamilton mencionou o técnico tricolor pela primeira vez em 9 de julho do ano passado. Passou a acompanhar mais e ficou fissurado. Dois meses depois escreveu o texto “Fernando Diniz vs O homem-máquina” em que exalta a proximidade do jogo funcional com a tradição de um estilo mais brasileiro de se jogar bola.

Jamie já foi notado por Fernando Diniz. Pessoas próximas ao treinador do Flu afirmam que foi o escocês quem entendeu melhor o estilo do técnico. Até mesmo Eduardo Barros, auxiliar de Diniz, o elogiou nas redes sociais e disse que o texto é “brilhante”.

Para ele, a preferência por um jogo mais posicional no futebol brasileiro não faz tanto sentido, dado o histórico de times envolventes, principalmente nas seleções históricas como 1958, 1970 e 1982.O estilo posicional, predominante na Europa desde o sucesso avassalador do Barcelona de Guardiola, seria muito mais para uma cultura europeia que não tem os jogadores do nível dos brasileiros. Jamie considera que Diniz tem uma linha de pensamento mais autêntica e histórica ligada ao futebol brasileiro.

– Diniz dá um exemplo do que pode ser um estilo tradicional mais brasileiro, mesmo sendo novo e diferente dos anteriores. Mas parece mais similar às versões antigas em muitas formas. Agora, temos uma situação que esse estilo de futebol está dando certo nas competições, porque as pessoas sempre falam: “Sim, é legal, mas sempre perde. Você toca, toca, toca, mas sempre perde”. É interessante ter um exemplo que o time vence. Na temporada passada terminou em terceiro no Brasileiro, foi uma boa temporada. Acho até que foi acima do que as pessoas esperavam.

Jamie joga nas 11. Antes de ser um homem casado, técnico, barman e pesquisador/debatedor sobre futebol no Twitter ele teve uma banda e chegou a tocar em festivais famosos como Glanstonbury, na Inglaterra, e SXSW, nos Estados Unidos. Hoje, aos 40 anos, busca voltar a ser treinador em tempo integral.

Diniz “quase radical”

Por mais que adore o estilo do técnico tricolor, Jamie acredita que Diniz seja “muito extremo” no estilo de jogo funcional. Mesmo assim, existem nomes que ele enxerga como mais próximos ao estilo do treinador do Fluminense do que Guardiola. É o caso, por exemplo, do Real Madrid campeão da Champions com Carlo Ancelotti e a Argentina de Lionel Scaloni campeã da Copa do Mundo. Ao mesmo tempo, compara a diferença nos estilos com filme, música e comida.

– É importante dizer que não significa que um seja ruim e o outro bom, mas são diferentes. Existem diferentes tipos de música, de filme, comida… Não é que um seja sempre o melhor estilo, mas é importante testar e entender as diferenças. É importante a gente tentar observar de onde vêm e como se desenvolvem. É uma parte muito interessante do futebol.

Por mais que se divirta com os jogos do Flu de Fernando Diniz e adore ver os jogadores fazendo corta-luz e tabelas (principalmente Ganso, seu jogador favorito), se Jamie pudesse implementar o que quisesse no próprio time, talvez não seguisse à risca o técnico predileto, mas pegaria algumas das premissas.

Quase como o movimento antropofágico dos modernistas brasileiros dá década de 1920 – que buscava absorver o que acontecia nas artes plásticas das vanguardas europeias da época para desenvolver a própria identidade -, ele considera que o estilo talvez não fizesse sentido em um time que não tivesse a cultura desse jeito de jogar. Como já foi um técnico muito posicional, tende a crer num estilo híbrido. A depender do adversário poderia estar de uma forma ou de outra, ou até mudar dentro da mesma partida.

Encaixe de Marcelo e Diniz na Seleção

Para o companheiro de profissão escocês de Fernando Diniz, a contratação de Marcelo tem tudo para ser uma grande parte no time do Fluminense para a temporada na lateral esquerda. Jamie considera que ele tem a qualidade técnica que qualquer camisa 10 gostaria de ter. A questão no início talvez seja a falta de entrosamento com os demais jogadores, mas não é nada que não possa ser ajustado com o tempo.

E se Diniz terá à disposição um dos maiores campeões do futebol mundial, existe a possibilidade de ele comandar outros nomes experientes. O nome dele é um dos cotados para assumir a seleção brasileira e, para Jamie, faz todo sentido, independente de trabalhar pouco no dia a dia com os jogadores convocados.

– Seria muito interessante e acho que tem grande possibilidade de mostrar um futebol bem bonito. Acho que os jogadores gostariam. Se o Brasil quiser desenvolver o próprio estilo de futebol, acho que Diniz seria interessante. (…) Na Copa do Mundo, Brasil parecia estável, mas eu não gostava muito, exceto contra a Coreia do Sul. Não achei que jogaram de forma espetacular. Os momentos foram bons, os gols foram por tabela com Neymar pelo meio. O estilo de Diniz teria mais chance de dar certo.

– A quantidade de treinos não seria um problema. Muitos jogadores já estão familiarizados com esse estilo de jogo desde criança. É menos complexo do que um estilo posicional. Porque ele demanda muito tempo e normalmente treina sem adversários. O jogo funcional no Brasil, que é o lar desse estilo de jogo, seria mais fácil de ensinar do que tentar implementar um estilo europeu posicional para alguns jogadores que provavelmente não gostam desse estilo. Imagino que eles fiquem incomodados de ficar o tempo todo na lateral e não interagir com os companheiros.

Capa do texto de Jamie Hamilton sobre Fernando Diniz — Foto: Reprodução

Capa do texto de Jamie Hamilton sobre Fernando Diniz — Foto: Reprodução

Por enquanto, os oito meses de aprofundamento de Jamie Hamilton nos times de Fernando Diniz apenas permitiram que ele assistisse aos jogos bem de longe, pelos vídeos e trechos que consegue ter acesso. Mesmo assim, fica a esperança de um dia ver uma partida do técnico favorito perto de casa.



Por Explosão Tricolor

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