Aliciamento de jogadores profissionais: uma análise






E as negociações envolvendo Pedro não param. Gilmar Ferreira, colunista do jornal “Extra”, informou nesta segunda que o Flamengo fez uma proposta salarial diretamente ao atleta. Ainda segundo colunista, a estratégia adotada pelo rubro-negro é a mesma que levou Arrascaeta para a Gávea: seduzir o jogador e criar um clima propício para a saída do atacante do Fluminense.
O colunista chega a dar números para a transação: por quatro anos de contrato, o Flamengo estaria disposto a pagar R$ 800 mil a Pedro, ou seja, R$ 48 milhões no total, caso o contrato seja integralmente cumprido. Lembrou ainda que o nosso atacante recebe cerca de R$ 200 mil nas Laranjeiras.
Se verdadeiros os valores noticiados, é claro que o atleta está balançado. Afinal, o seu salário seria quadruplicado e ele estaria num time que, nos últimos anos, tem se notabilizado por sua solidez financeira, o que seria uma garantia de pagamento em dia.
O colunista, porém, no afã de validar a atitude da diretoria rubro-negra, disse que a negociação é construída com “frieza e esperteza, como em toda negociação de grande porte”. Contudo, ele se esqueceu que além da esperteza e frieza, a conduta dos dirigentes da Gávea deve ser analisada sob a ótica de regulamentos que proíbem eventual aliciamento no futebol.
Aliciar atletas profissionais de futebol é algo que a FIFA e a própria CBF buscaram coibir. Seja para jogar pra galera, seja porque realmente entendem que a competitividade é a base do esporte, as duas entidades possuem regramentos que proíbem o aliciamento.
No caso da FIFA, em 7 de junho de 2010 ela editou o Regulations on the Status and Transfer of Players, ou, em tradução livre, “Regulamento sobre Status e Transferências de Jogadores”. Além de estabelecer regras gerais sobre a transferência de jogadores, ele prevê vários mecanismos de proteção aos clubes que são vítimas de aliciamento.
A CBF também possui estatuto semelhante, sendo chamado de “Regulamento Nacional de Registro e Transferências de Atletas de Futebol”. Como dito, o estatuto da FIFA traça apenas as regras gerais, sendo que as punições previstas devem ser repetidas pelos regulamentos editados pelas federações e confederações, salvo se estas estabelecerem regras mais severas, caso em que prevalecerá o estatuto local em detrimento da disciplina dada pela FIFA ao assunto.
Especificamente quanto à transferência de jogadores, tanto a FIFA quanto a CBF dispõem que o jogador somente pode assinar com outro clube quando vencer o contrato ou quando restarem seis meses para tanto. Estabelecem ainda que o clube que pretende celebrar contrato de trabalho com atleta profissional fora dessas hipóteses deverá informar ao clube atual dele, por escrito, antes de entrar em negociações com o profissional.
Interpretando os dois dispositivos, temos o seguinte: Pedro não pode assinar com o Flamengo neste momento se não houver acordo entre os clubes e nem o clube rubro-negro pode oferecer valores salariais ao atleta sem que tenha informado ao Fluminense, por escrito, a intenção de contratar o jogador.
Caso não sejam cumpridos os requisitos acima, poderá haver, por parte do Flamengo, o indevido aliciamento de atletas, cujo ato prevê punição que vai desde a multa até a proibição de contratação de novos jogadores. 
No Brasil e no mundo transitam diversas reclamações de clubes contra o chamado aliciamento. O próprio caso Arrascaeta suscitou diversos questionamentos, apesar de não ter ido adiante até pelo acordo celebrado entre Cruzeiro e Flamengo. Na prática, como as punições não acontecem, há a criação de um ambiente favorável à atitude.
É óbvio que se o Flamengo tiver comunicado ao Fluminense expressamente a intenção de negociar com Pedro, não há descumprimento às normas da FIFA e da própria CBF. Contudo, se tal não ocorreu, o fato pode ser levado aos dois órgãos, caso a diretoria tricolor entenda conveniente.
Cabe à diretoria informar os meandros das conversas, já que demonstrou desinteresse em negociar o atacante com o Flamengo, o que sugere a inexistência de negociações sigilosas. Com a participação cada vez maior dos torcedores, inclusive pelas redes sociais, a informação oficial partindo diretamente da diretoria é dever da diretoria e direito da torcida e somente assim será possível averiguar se a conduta do clube da Gávea merece censura ou não.
Envolvendo o fato vai uma crítica importante para a diretoria que está no início de jornada: colocar em dia apenas os salários de Pedro e deixar os demais a ver navios pode impedi-lo de ir de graça para o Flamengo, mas não impede o descontentamento geral e cria um ambiente ruim no vestiário. Sei que ainda está cedo, mas já é a hora de viabilizar investimentos para quitar o salário da turma. Este é o ponto fundamental da gestão.

Evandro Ventura