JOGOS MEMORÁVEIS – Fluminense 1×0 Flamengo: Recordar é viver… Assis acabou com você!




Amigos Tricolores,

A missão hoje é importante. Convocado para escolher o jogo memorável da minha vida para escrever sobre ele, praticamente não tive dúvidas.

Torcer pelo Fluminense é colecionar emoções, vibrações, campanhas memoráveis, arrancadas épicas, milagres condenados pela matemática etc. Foram muitos os jogos inesquecíveis, posso escrever sobre uns 50 que presenciei em meus 40 e tantos anos de arquibancada.

Mas aquele flaxFlu, em 11 de dezembro de 1983, no Maracanã, definitivamente ficou marcado para mim. Por tudo que envolveu aquele jogo, pela dramaticidade de resolver a partida no último lance, por eliminar o rival, cuja torcida já comemorava nossa eliminação.

Eu lembro de muitos detalhes daquele jogo. E muitos outros pude relembrar ao ver ontem um vídeo inteiro da partida, no youtube, para me preparar ainda melhor para assumir a responsabilidade de redigir este texto. (Quem estiver interessado é só acessar lá. Vale a pena.)

Era o triangular final do Campeonato Carioca, de um tempo em que esta era a principal competição do calendário. Valorizado, em dois turnos, sem esdrúxulas armações com jogos fabricados, manobras de bastidores ou presidente da Federação favorecendo algum clube grande de forma escancarada.

O Flu ganhara o primeiro turno com excelente campanha invicta: 11 jogos, 9 vitórias e 2 empates, 20 gols pró e apenas 3 contra. O Fla venceu o segundo turno e o Bangu entrou como o time que mais somou pontos ao longo da competição.

No primeiro jogo do triangular tivemos um empate insosso, Flu 1 x 1 Bangu, gol de Marinho aos 24 do primeiro tempo e empate nosso de Paulinho, aos 14 da etapa final. A galera do Flu, e eu estava lá, saiu meio decepcionada. O Flu não jogou bem, o jogo foi fraco.

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O casal 20 comandava o ataque tricolor.

Coube ao Fluminense jogar com o Flamengo a segunda partida do triangular, e não podia nem pensar em empatar, pois estaria eliminado. O Bangu jogava por três empates, por ter tido o maior número de vitórias na competição, e assim fomos para o segundo jogo precisando da vitória. E para o Fla o empate até servia, eliminava o Flu e bastaria ganhar o terceiro jogo do Bangu para levantar a taça. Entraram com o regulamento debaixo do braço.

Não éramos favoritos. Apesar da boa campanha no primeiro turno, o time que ganhava o segundo turno normalmente vinha mais embalado para a decisão. E além disso o Fluminense fez um segundo turno pífio, praticamente abandonou a competição, ficando em 10º lugar entre os doze participantes. Parecia ter perdido completamente o ritmo.

Lembro também de um detalhe pessoal: era o dia do aniversário do meu saudoso pai, com quem, lógico, eu tinha almoçado, junto com a família. E, lógico, ele, tricolor como eu, tinha me liberado para ir ao jogo, às 17 horas. Ele que me ensinara essa paixão… Curioso que o flaxFlu do gol de barriga, em 1995, foi no dia do aniversário de minha mãe, 25 de junho.

Então, naquela tarde eu vi um jogo muito amarrado, picado, parado. Não interessava muito ao Flamengo que o jogo se desenvolvesse. Era difícil o jogo fluir. O gramado estava pesado, escorregadio, consequência de uma tarde chuvosa.

Lances muito violentos no primeiro tempo. Pancadaria e revides nos lances seguintes. O árbitro, Arnaldo César Coelho, um acomodador de carteirinha, irritava o Fluminense distribuindo cartões somente para o time tricolor. Mozer e Figueiredo, a dupla de zaga adversária, estavam pendurados, não podiam levar cartão, pois ficariam fora do jogo contra o Bangu. E aí o Arnaldo deixou-os soltos. O time do Flu foi se irritando com o juiz, principalmente num lance assassino aos 38 do primeiro tempo, quando o Mozer deu um carrinho voador (isso mesmo, começou numa voadora e acabou em carrinho) no Aldo, num lance em que o cartão vermelho direto ficaria barato. Podem ver no vídeo. E o que fez o do apito? Falta marcada e seeeeeegue o jogo, para desespero do time tricolor. Nem um amarelinho. Pode isso, Arnaldo?

E se o negócio era ensebar e não deixar o jogo se desenvolver, os adversários fizeram uma coisa inédita no Maracanã. Eles que já comemoraram título onde o craque da partida foi um ladrilheiro, que virou herói por invadir o campo e segurar uma pressão do Vasco, para não levar o empate em 1981, naquela tarde soltaram simplesmente um urubu no gramado.

Sim, aos seis minutos do primeiro tempo o animal, que passeava entre os atletas, obrigou o árbitro a parar a partida, e só daria o jogo quando tirassem o bicho do campo. Até porque, naquele momento eram 12 urubus contra 11 tricolores. E quem iria tirá-lo? Amigos, foi um espetáculo circense que durou sete minutos e quarenta e quatro segundos. Era funcionário com capa para jogar no bicho, outro com a redinha que os gandulas usavam para pegar bola no fosso, todos pagando mico e levando volta do invasor.

E a galera deles adorava, se divertia. Se o Aldo, nosso lateral-direito, não resolvesse pegar o urubu na mão, tirando-o do gramado, acreditem: estaríamos lá até agora assistindo à palhaçada. Aldo foi bicado pelo bicho, mas fez um curativo e foi para o jogo. Vale a pena ver essa pantomima no vídeo do youtube, aos seis do primeiro tempo.

Naquele tempo não havia praticamente acréscimos, não tinha plaquinha com tempo adicional. Se hoje a cera fica praticamente impune, mesmo com plaquinha, naquele tempo era pior. Claro que o Arnaldo, naquele caso, teve que compensar. Mas do tempo em que o jogo ficou parado deu 40 segundos a menos no final, algo como se o primeiro tempo tivesse 44 minutos e 20 segundos. As ceras, as pancadas, os atendimentos? Ficava tudo por isso mesmo e um abraço. Quando o juiz acrescia era no máximo um minuto, a critério só dele.

E assim foi também no segundo tempo. Jogo amarrado, poucos lances perigosos de lado a lado, muita cera dos rubro-negros. O próprio comentarista, no tal vídeo do youtube, já vai fazendo as projeções para o terceiro jogo e considerando o Flu eliminado. Era o Marcio Guedes. Mais um que quebrou a cara.

A torcida adversária, a partir dos 40 do segundo tempo, acenava lencinhos e gritava: “Eliminado”. Cada tiro de meta levava um minuto para ser batido. O jogo não se desenvolvia de jeito nenhum!

Mas os tricolores respeitam mais do que ninguém aquela máxima: o jogo só acaba quando termina. Alguns mais incrédulos até já tinham saído, muitos amigos me contam que souberam do gol nas ladeiras do Maraca.

Amigos, eu estava lá, firme, até o final, ao lado do meu amigo Márcio Martins, parceiro de muitos títulos… Houve um impedimento bem marcado do jogador deles, Cláudio Adão, aos 45 do segundo tempo. Tem urubu chorando até hoje dizendo que não houve impedimento do Adílio, que foi erro do bandeira, mimimi mimimi. É pena que naquele tempo só havia uma câmera, e então o lance não aparece bem. Se vocês tiverem a oportunidade de observar o vídeo, o Cláudio Adão tocou a bola para o Adílio, e no momento do passe o bandeira acusou. Era o Cláudio Adão que estava vindo da figura A para a figura B. Ele que estava impedido, partiu lá da frente para tocar a bola mais atrás e lançar o Adílio.

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O momento exato em que Assis deslocou o goleiro Raul e a bola entrou mansamente.

Muito bem: o Paulo Victor pegou a bola rápido, entregou-a ao Duílio, que rapidamente cobrou e acionou o Deley na linha do meio-campo. Dá para ver no vídeo que neste momento o Arnaldo, que estava doido para acabar aquele jogo, olhou para o relógio. Mas o Deley lançou o Assis milimetricamente pela direita. Tão milimetricamente que o craque só teve que se ajeitar na corrida, em passadas largas, dar o primeiro toquinho na bola, um segundo toque colocando à feição da perna esquerda e um terceiro e definitivo toque, tirando do goleiro Raul, sem muita força, já na chegada da pequena área. A bola entrou mansamente ao mesmo tempo em que chegava toda a linha de defesa adversária, todos desesperados, com as mãos nas cabeças, desolados, gritando, xingando, aos 45 minutos e 30 segundos da etapa final. No último lance da partida! Eu soube depois que nem foi dada nova saída.

E eu, ali, atrás do gol onde ocorreu esse lance, simplesmente fui ao maior delírio nos meus mais de 40 anos de arquibancada. Eu juro: jamais um gol me proporcionou tanta alegria! A galera do Fluzão simplesmente enlouqueceu às 19:04 horas daquele domingo. Nem vi mais nada, foi uma apoteose na arquibancada. Lágrimas de emoção. Todo mundo pulando, correndo, pois naquele tempo não tinham essas cadeirinhas irritantes da modernidade. Difícil descrever porque a emoção me contagia, me domina, me causa uma letargia que impossibilita que eu consiga descrever tudo o que senti com aquele gol… Foi a verdadeira Explosão Tricolor!

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Assis sai enlouquecido para comemorar o gol mais emocionante que vi. Um gol que valeu o início da mística do Carrasco.

Os que gritavam “eliminados” e acenavam seus lencinhos calaram-se, incrédulos, e certamente aproveitaram seus lencinhos para enxugar lágrimas de tristeza. Eliminados estavam eles, e a História registra que em decisões eles não podem mesmo conosco. Se têm mais vitórias, é verdade, em decisões eles raramente se dão bem conosco. Foram 11 na História, com 8 vitórias nossas contra 3 deles. Até empurrando com a barriga nós já ganhamos decisão deles.

Gritar campeão ainda não era possível, mas não havia um só tricolor que não soubesse que o título foi resolvido naquele momento mágico. Faltava o jogo entre os eliminados rubro-negros contra o Bangu. O jogo seria na quarta-feira seguinte, e bastava o Bangu não vencer para o Flu levantar seu 25º título estadual.

Se torci pelo time da Gávea na quarta-feira? Lógico que não, é simplesmente contra minha essência! Além do mais, se eles vencessem apenas teríamos que disputar um jogo extra contra o Bangu, e tenho a certeza de que não deixaríamos o título escapar.

E o Fla venceu por 2 x 0 e garantiu mais um vice, para delírio da galera tricolor, que, nos radinhos de pilha, vibrava com a conquista. Muitos até se infiltraram no estádio e há quem diga que era a maior torcida naquele terceiro jogo.

E o treinador Claudio Garcia, que ganhou os dois turnos da competição? Ex-jogador das Laranjeiras, Garcia foi o nosso treinador no primeiro turno (Taça Guanabara) e foi aliciado e tirado do Flu no dia seguinte da conquista. Saiu por uns tostões a mais. Ganhou o segundo turno por eles, e no final perdeu o título para o Fluminense, do técnico Carbone, que assumiu em seu lugar. Até circulava uma piadinha, na época: “Vc sabia que o Claudio Garcia morreu?” “Como?” “Foi carbonizado!”

Carbonizado eu não diria, mas que ficou queimado por uma transferência sem escrúpulos, ah, isso ficou.

Fluminense: Paulo Victor, Aldo, Duílio, Ricardo Gomes e Branco; Jandir, Deley e Assis; Leomir (Ronaldo), Washington e Paulinho. Técnico: Carbone.

Flamengo:  Raul, Leandro, Figueiredo, Mozer e Júnior; Andrade, Cléo (Lico) e Tita; Lúcio, Edmar (Cláudio Adão) e Adílio. Técnico: Claudio Garcia.

Renda: Cr$ 130.622.700,00, com 83.713 pagantes.

Assis e eu
Eu e Assis, num churrasco promovido por torcedores tricolores, em 2006.

E foi com muita emoção que em 2005 compareci a um churrasco de torcedores do Fluzão, organizado por meu amigo tricolor Ailton Gerão, em que o convidado era simplesmente o carrasco Assis. Você sabe o que representa sentar a uma mesa com seu ídolo e conversar sobre este e tantos outros jogos? E ainda fui sorteado com um brinde tricolor, o livro do Nelson Motta, e o prêmio foi entregue simplesmente por meu ídolo!

No ano passado, numa interminável fila de tricolores para tirar foto com o ídolo Assis, já doente (embora escondesse a doença), Assis atendeu a todos, com a maior paciência, no Bar dos Guerreiros. E quando chegou a minha vez eu falei: “Você deve estar cansado, Assis!” E ele me confidenciou: “Você nem imagina o quanto!” E eu completei: “Mas é Guerreiro, persistente. Não fosse assim e não teria feito aquele gol que mais me emocionou em minha vida, no último lance do jogo.” Ele apenas sorriu. Um mês depois faleceu, para tristeza de todos nós.

E assim, amigos, foi o dia que iniciou a história da mística do carrasco. E surgiu a musiquinha, que até hoje se canta: “Recordar é viver… Assis acabou com você!” E foi assim também no ano seguinte, quando Assis deu o BI ao Flu em cima do rival da Gávea, dessa vez de cabeça, numa vitória igualmente emocionante em que eu estava novamente presente. Mas aí, Amigos Tricolores… Essa é uma outra história… De muitos sacodes sobre eles.

De muitas emocionantes e comoventes conquistas!

Porque é como eu digo sempre:

O IMPORTANTE É O SEGUINTE: SÓ DÁ NENSE!!!

PAULONENSE / Explosão Tricolor

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