O clube-empresa é bom para o Fluminense?




Enfim, saímos do Z-4. Por mais que o estilo de jogo de Oswaldo de Oliveira não me agrade, não há dúvidas de que é melhor vencer jogando feio que perder jogando bonito. No atual estágio tricolor, cada vitória merece comemoração. Em cima do Corinthians então, clube que com muito mais recursos financeiros, o grito deve ser ainda maior.

Um assunto que pouco tem frequentado as mesas de bares e os encontros de torcedores, até porque não é tratado de forma clara e abrangente, é a possibilidade de serem implementadas no país as sociedades empresariais de clubes de futebol. Em outras palavras, o conhecido clube-empresa. 

Para alguns, essa é a solução mágica para a organização do futebol brasileiro: “vai ser igual na Europa”, “tem que profissionalizar mesmo”, dentre outras expressões utilizadas. Por mais que seja complexo, está na hora de o torcedor começar a colocar este assunto na ordem do dia, até porque Rodrigo Maia, o intitulado “Primeiro Ministro” do Brasil e atual Presidente da Câmara dos Deputados, está rodando o país abraçando a causa.  

Inicialmente devemos entender que não existe um único modelo europeu. Cada país tem uma forma de encarar o assunto e o seu sucesso está muito mais relacionado “ao ambiente que ao modelo”, conforme disse ao El País, o economista do Grupo Plur, Fernando Ferreira. Ou seja, são as pessoas que estão à frente do futebol profissional que irão aprimorá-lo, e não o modelo adotado.

Ao contrário do Brasil, que usa o sistema associativo e não permite que sociedades empresariais sejam proprietárias dos clubes, na Europa isso é permitido, havendo distinção entre os países. Na Alemanha, por exemplo, admitem-se acionistas e sócios fora dos quadros do clube, desde que estes – os clubes – sejam os majoritários.

Na Itália e na França os acionistas podem deter 100% das ações do clube, havendo casos em que eles possuem um único dono. Este é o caso do PSG e do Milan. O mesmo se diga na Inglaterra, onde também se permite que sociedades empresárias sejam donas dos clubes. 

Mas também há modelos associativos de sucesso. Os dois mais eloquentes são Real Madrid e Barcelona. Ambos são constituídos como associações e geridos por presidentes com mandatos temporários, o que quer dizer que não possuem proprietários, mas, sim, gestões diferentes eleitas em processos democráticos. 

Não se pode esquecer que o Figueirense tentou dar um drible na proibição legal brasileira e implementou, por vias transversas, o chamado clube-empresa. Denomino “vias transversas” porque, na verdade, criou-se uma empresa para gerir o futebol e ela passou a deter 95% do comando do clube. Não foi feita a venda do clube, mas um “compartilhamento” da administração do futebol.  

Porém, a promessa de profissionalização e de transformar o Figueira em um time competitivo foi por água abaixo, a ponto de os jogadores se negarem a entrar em campo diante do Cuiabá, pela Série B do Brasileirão, perdendo o jogo por W.O. A maioria da torcida culpa a empresa Elephant que passou a comandar o clube tendo à frente Cláudio Honigman, empresário que já fez parceria no futebol com Ricardo Teixeira, ex-presidente da CBF, e Sandro Rosell, ex-mandatário do Barcelona.

É claro que a experiência malsucedida do Figueirense pode estar relacionada à inaptidão da empresa para gerir o futebol do clube, mas é certo que, ao ter um dono, este leva em consideração muito mais o lucro que os resultados esportivos. Por mais que um e outro estejam relacionados, se o time ficar em situação ruim é possível que os sócios saiam na primeira oportunidade e passamos a ter clubes em estado legal de falência, deixando diversos torcedores na mão.

De minha parte, não vejo nenhum problema no modelo associativo que adotamos, até por ter referenciais de qualidade ao redor do mundo como já mencionei. Gosto dessa ideia de que o clube não tem dono e que a torcida, na verdade, é a sua grande proprietária. Ainda que na prática não seja assim, essa é a ideia que se quer passar com as associações.

Por outro lado, proibir que os clubes se tornem empresas é retirar-lhes uma possibilidade adotada em diversos países e que, se bem feito, pode dar frutos. É o que tudo indica que ocorrerá com o Botafogo e sua parceria com os irmãos Moreira Salles – leia-se Itaú – que é um projeto que começa aparentemente bem construído e com muita informação pública sobre ele. É a famosa transparência que tanto falta ao Fluminense.

Resumo da ópera: sou favorável à permissão dos clubes-empresas, desde que não seja obrigatório, permitindo que cada clube, por meio de seu quadro societário, avalie a melhor forma de se constituir. É a famosa liberdade associativa e societária, com a consequente liberdade de constituição.

Especificamente no caso do Fluminense, com a bagunça estabelecida durante anos no clube e que remonta há gestões anteriores à da própria Flusócio, o clube-empresa poderia ser uma alternativa, até para eliminar excesso de BackOffice e de gente ganhando dinheiro no clube sem que ninguém saiba quem é e o quanto recebe.

Todavia, uma medida menos drástica e que manteria a autonomia tricolor seria separar a gestão do futebol da parte social do clube, de modo que cada um tome conta do seu: o dinheiro do futebol é do futebol e o da piscina é da turma dos piscineiros. Seria o mesmo presidente, mas com administração autônoma em cada setor. Isso pode ser o início da retomada tricolor com a devida manutenção da sua democracia, hoje contando com sócios do país inteiro podendo votar e influenciar no futuro do clube.

Enfim, ainda há muito o que ser discutido e os pormenores, como questões tributárias, trabalhistas e previdenciárias, devem ser exaustivamente debatidos em público até para que as ideias amadureçam e se consiga fortalecer o futebol brasileiro. E que o debate atinja em cheio o Fluminense e melhore a sua governança, ainda que mantido o modelo associativo, permitindo que futebol seja livre do conservadorismo ruim da parte social das Laranjeiras, chegando mais próximo daquilo que a arquibancada almeja. 

Ser Fluminense acima de tudo!

Evandro Ventura