Marcos Felipe e o renascimento da Leiteria




Marcos Felipe (Foto: Lucas Merçon / Fluminense FC)

‘’ A leiteria! Vale a pena traçar aqui, sinteticamente, o seu resumo biográfico. Abriu as portas, pela primeira vez, em 51. De repente, os adversários começaram a perceber que o Fluminense não jogava somente com classe, somente com técnica. Castilho era bom, era ótimo, era formidável. Mas um arqueiro tem os limites da condição humana. Ora, Castilho fazia defesas sobrenaturais. E todo mundo começou, por trás do arqueiro, a ver a influência extraterrena da leiteria. Numa amargura medonha, o inimigo rosnava que Castilho era o leiteiro. O fato é que o Fluminense tornou-se gloriosamente o campeão de 51.’’ (Nelson Rodrigues, A volta da Leiteria, Manchete Esportiva, 1/11/1958)

O que dizer do jogo entre Santa Fé e Fluminense, leitor? Eis a verdade, amigos: na Guanabara, em Curitiba, em Salvador, cada sofá era como uma arquibancada ardendo de nervosismo e paixão. O Flu, logo no começo da partida, abriu o placar com Fred. Depois de boa trama do ataque Pó de Arroz, com Kayky e Nenê, Fred usou novamente seu olfato absoluto, o faro do artilheiro impiedoso. Era o gol 184 do centroavante com a camisa Tricolor. Fred empatava com Orlando Pingo de Ouro.

O Santa Fé era um adversário de valor. Em nenhum momento a equipe colombiana desistiu da partida. No começo do segundo tempo, em boa jogada pela esquerda, Egídio cruza e Fred marca novamente. O gol, em si mesmo, era histórico – D. Fredon tornava-se o segundo maior artilheiro Tricolor em números absolutos. Nosso eterno camisa 9, certamente, foi um dos destaques da partida, um bravo e honrado guerreiro da batalha de Armênia. Foi bravo e honrado como toda a equipe. Excetuando, é claro, Egídio.

E o que faz de Egídio uma exceção? Eu nem precisaria explicar, mas, obviamente, sua expulsão infantil prejudicou o time. O adversário era aguerrido, sofria um gol e continuava sua busca para o ataque. E, justamente no momento em que descontava, pressionava e começava a ganhar campo, o lateral Tricolor resolveu contribuir com as ambições adversárias – tomou o vermelho.  Não quero mais falar do vilão da partida. Quero falar do Herói. Eu quero falar do renascimento da Leiteria, da sorte e do talento do arqueiro Tricolor.

Sou de uma geração sofrida. Uma geração que cresceu na escassez de títulos e na orfandade de grandes goleiros. Sou da era pós Paulo Victor. No século XXI, o jejum de grandes títulos terminou, mas, as traves Tricolores ainda careciam de um grande goleiro, de um herdeiro da tradição de Carneiro de Mendonça e São Castilho. Cavalieri chegou perto, mas, infelizmente, não conseguiu herdar plenamente a honraria de arqueiro eterno, o título de Barão dos milagres e outros feitos impossíveis.

E o nosso herói, Marcos Felipe? Não é a primeira vez que escrevo sobre o guarda metas. Muitos pensavam que o arqueiro não estava à altura da Libertadores, dos desafios e batalhas da grande competição continental. E eu dizia justamente o inverso, amigo leitor: Marcos Felipe vai vestir os novos trajes da Leiteria, vai herdar o título de Barão das grandes defesas e milagres. O jogo de ontem foi uma prova empírica e colossal de minha hipótese: Marcos Felipe é o melhor goleiro do Brasil!

Além de garantir a vitória, de surgir como o herói nos momentos difíceis, o jovem goleiro Tricolor foi capaz dos maiores feitos. Lembra daquele escanteio no final do jogo e de como nosso goleirão saltou para a bola? Lembra das bolas alçadas na área? Quem ainda recorda da baita confusão na defesa do Flu no fim do jogo? Mesmo ‘’mal colocado’’ Marcos se fez novamente heroico! Sorte? Sim! E a sorte do goleiro Tricolor, desde Nelson Rodrigues, se chamada Leiteria. Repito: Marcos Felipe representa o renascimento da Leiteria Metafísica!

-O Marcos do século XXI reencarna as virtudes do Marcos primordial. Marcos Felipe é a reencarnação de Marcos Carneiro de Mendonça, de São Castilho e da Leiteria! E viva o novo grande herói, o novo Barão das defesas e milagres memoráveis! Viva o arqueiro Marcos Felipe!

Teixeira Mendes