Fluminense dos sonhos versus Fluminense real




Foto; Vinicius Toledo / Explosão Tricolor



Nas discussões da torcida, cada tricolor tenta fazer prevalecer o próprio entendimento sobre os melhores caminhos para o clube. Afinal, paixão e vontade de reerguer o gigante nos são comuns, formam o elo que dá sentido à existência de tais debates.    

Acontece que tais conversas, muitas vezes, não chegam a lugar nenhum, porque cada um de nós usa uma versão diferente de Fluminense como referência. 

Às vezes, é um Fluminense ideal. Este só existe no plano dos sonhos, em um cenário fantasioso no qual várias dificuldades do mundo real não existem ou podem ser facilmente contornadas.

Nesse Fluminense dos sonhos, urge contratarmos um treinador estrangeiro, arrojado. Ele há de querer trabalhar nas Laranjeiras, porque o Fluminense é imenso. E tem tudo para implantar seu estilo de posse e agressividade sem maiores problemas, apesar do calendário apertado, de não ter tempo para errar e não ter participado da montagem do elenco.

Além disso, nessa dimensão, não tem problema deixar de renovar com o Dodi, porque se acha vários iguais a ele na série B. Também valem alguns imperativos empolgantes: temos que disputar todos os títulos e ter elenco à altura da nossa história. Se passar dos 30, o atleta já está com um pé na aposentadoria. E o Ganso tem que ser titular. 

Paralelamente, existe o Fluminense do mundo real, com as dificuldades que ele impõe. Gestões amadoras, dívida indecente, penhoras frequentes, carência do torcedor…

Aqui, treinador gringo, valorizado, se importa mais com o dinheiro caindo na conta e com a expectativa de levantar troféu do que com o peso da camisa. Geralmente, não simpatiza com quem não paga em dia, quem se desfaz dos melhores jogadores todo ano, quem costuma demitir dois técnicos por temporada. E quando vem, precisa de tempo e paz para desenvolver seu trabalho. 

Nessa realidade, faz trocentos anos que não vivemos o desespero da luta contra o rebaixamento. Não pagamos em dia faz uma eternidade e é um milagre quando um destaque do time não tenta sair na primeira chance. Jogar Taça Libertadores? Memória distante.   

Para esse Fluminense de verdade, valem coisas impensáveis para o outro.

Por exemplo, Nenê é fundamental. É o artilheiro do clube na temporada, disparado, com 19 gols. O segundo, com 8, já foi doado. O terceiro, Marcos Paulo, marcou 5, todos em uma sequência de 4 jogos contra pequenos no longínquo mês de março. 

Ah, mas ele só faz gol em adversário fraco! E tome Nenê artilheiro do Flu no Brasileiro e Copa do Brasil. Ah, mas só faz de pênalti! Se tirar todos esses, continua sendo nosso maior goleador, no Brasileiro ou fora dele. Isso não significa que ele deva jogar todas as partidas, por óbvio, mas mostra que não se trata de um qualquer em nosso elenco, como muitos advogam.

No Fluminense real, também é um absurdo perder o Dodi de graça (no mundo dos sonhos, pensar assim é ser medíocre). Meses atrás, nós fizemos uma oferta de alguns milhões de euros pelo Allan, de posição, nível mostrado no clube e idade próximos, ora bolas. Não vou nem entrar no mérito da possível perda do MP, que representaria outro patamar de absurdo. Além disso, aqui a briga por G7 é importantíssima, sendo legítimo se satisfazer com esse nível de disputa.

Então, se o Fluminense dos sonhos está longe da realidade, ele deve ser dispensado? De forma alguma! A existência dele nos corações tricolores mantém viva a esperança de voltarmos ao protagonismo. Mais que isso, serve de lembrança da responsabilidade que temos com a história de trazer o clube de volta para os trilhos. 

Mas penso que há o momento certo para cada um. E o meio da temporada, definitivamente, é tempo para dar mais atenção ao Fluminense do mundo real.

Diante desse raciocínio, entendo não ser razoável a insistente ânsia pela demissão do treineiro Maionese, que volta e meia está na boca do torcedor. Não concordei com ela sequer no momento mais delicado do trabalho, apesar de criticá-lo com frequência nesta coluna.  

Tudo bem que nós queremos mais repertório, jogar bola de verdade, como o Fluminense dos sonhos. Mas, no mundo real, Odair entrega exatamente o que se esperava dele quando contratado: uma equipe organizada, com vestiário bem gerido, padrão de jogo, competitivo, que briga na primeira página. 

E o faz ainda que a diretoria boicote o futebol do clube. Sem passar um mês sequer sem dívidas com o elenco, com venda de dois titulares (incluindo o melhor da equipe) em meio ao Brasileiro. A diretoria, aliás, incrivelmente achou razoável passar 17 rodadas (e contando) com moleques de Xerém que sequer tinham sido testados no profissional como reposição única aos negociados.  

Na ótica do mundo real, o trabalho do treineiro, apesar dos diversos defeitos, é satisfatório. Portanto, amigos tricolores, sem que abandonemos a nossa utopia de futebol ofensivo e protagonista, sem que passemos pano para escalações e substituições burras, prudência excessiva e equívocos diversos, acredito ser momento de manter ao menos um pezinho no chão e deixar o homem trabalhar. Não existe solução mágica.  

Nas últimas semanas, apesar do frustrante empate com o Ceará em casa, voltamos a ter boa sequência. Fora esse, vencemos Coritiba, Goiás e Bahia, empamos contra Botafogo e Galo. Lá se vão, pasmem, 6 jogos sem perder. 

Os motivos? Vários. Nino voltou a jogar bola; Fred deu conta, ao menos por enquanto, de preencher o vácuo deixado na centroavância pela doação do Lewa; Odair soube aproveitar bem a variação do 4-2-3-1 para o 4-3-3 em determinadas partidas; alguns jogadores sem prestígio com a torcida, como Yago, Hudson, Muriel, Danilo Barcelos, Pacheco e outros tiveram bons momentos.   

Mas, em especial, destaco dois fatores. Primeiro: nosso elenco, para os parâmetros do Fluminense da vida real dos últimos anos, não é ruim, como eu já tinha defendido. Nessa sequência, passamos por surto de Covid e tivemos quase um time de desfalques em diversas jornadas. Contudo, os substitutos mantiveram o nível, que não é lá essas coisas, mas nos permitiu continuar sonhando com a volta à Libertadores. 

Segundo: a sequência não foi das mais difíceis. Logo voltará a complicar e a tendência será descermos alguns degraus na tabela, com nova crescente na pressão pela cabeça do Maionese. Contudo, não nos enganemos, nosso elenco é para isso mesmo. Lutaremos pelas últimas vagas, contra concorrentes com mais time que nós.

Nas últimas semanas, vieram à tona denúncias de improbidade no Fluminense. Nos dias atuais, é muito fácil inventar e fazer viralizar uma história dessas. Abandonando a prudência, muita gente no supremo tribunal da internet já condenou funcionários e gestores do clube. Não é o caso. Contudo, diante da grande repercussão, é um absurdo que o presidente não tenha convocado uma coletiva para explicar a situação ao torcedor. Nós somos a razão de existir do clube, e a frieza de notas oficiais não passa confiança à maioria dos tricolores. 

ATÉ AQUI NOS ANOS ANTERIORES:

2018 – Brasileirão: 22 pontos (9ª colocação); Sul-Americana: classificado à 2ª fase, após eliminar o Nacional Potosí-BOL; Copa do Brasil: eliminado na 3ª fase pelo Avaí.

2019 – Brasileirão: 12 pontos (18ª colocação); Sul-Americana: classificado à 2ª fase, após eliminar o Antofagasta-CHI; Copa do Brasil: pela ida das oitavas de final, empate por 1×1, em casa, contra o Cruzeiro.

Vale dizer que insisto em comparar com as temporadas a partir de 2018 porque este foi o primeiro ano que nos planejamos após termos a noção do rombo deixado pela gestão Peter Siemsen. É o ponto mais baixo do clube desde a saída da Unimed, que revelou o tamanho da nossa pobreza. A recuperação, portanto, começa a partir dali.

VENCE O FLUMINENSE!

Tarik Moussallem



Confira a agenda tricolor nos próximos seis jogos da temporada:

18ª rodada

25/10 – Domingo – 16h – Fluminense x Santos – Maracanã

19ª rodada

31/10 – Sábado – 21h – Fortaleza x Fluminense – Castelão

20ª rodada

08/11 – Domingo – 20h30 – Fluminense x Grêmio – Maracanã

21ª rodada

CBF confirmará data e horário – Palmeiras x Fluminense – Allianz Parque

22ª rodada

CBF confirmará data e horário – Internacional x Fluminense – Beira-Rio

23ª rodada

CBF confirmará data e horário – Fluminense x Red Bull Bragantino – Maracanã